AOS QUE DIVIDEM E DIMINUEM PESSOAS
autor: Nilton Bustamante
Ainda que se possa dizer que são simples brincadeiras, corriqueiras e
inofensivas observações, que causam graça, há algo mais profundo nisso
tudo: preconceito social (ainda que não percebam).
Aos que
ignoram, devemos alertar que as expressões e formas linguísticas
(escritas ou faladas) não são certas, nem erradas, nem engraçadas - são
diferentes umas das outras. José Lemos Monteiro, intelectual versado em
linguística, já enunciava em seus trabalhos sobre o preconceito
linguístico: “são critérios de ordem social e não de natureza
estritamente linguística os que subsistem ao se avaliar uma forma de
expressão como errada ou correta. O que se julga erro nada mais é do que
uma diferença devida a fatores múltiplos, entre os quais, a região, a
classe social do falante e o registro ou situação comunicativa. Seria
bem mais lógico que, em vez de se ensinar que as frases (formas de se
falar) são corretas ou erradas, se transmitisse a consciência de que a
língua não é uniforme nem estática e que, por isso mesmo, admite uma
pluralidade de usos. Estes podem ser expressivos ou inexpressivos,
elegantes ou grosseiros, comuns ou raros, formais ou informais,
adequados ou não aos propósitos comunicativos, sempre diferentes uns dos
outros e jamais errados em sua essência.”.
E Trudgill disse
além: “... são igualmente bons como sistemas linguísticos, uma vez que
são adequados às necessidades de seus falantes. Desse modo, o sentimento
de que as formas discrepantes do modo de falar culto são erradas se
deve a um grave preconceito social.”
É de se admirar que essas
pessoas elitizadas que moram bem, se alimentam bem, se vestem com roupas
de qualidade, que frequentam os melhores lugares, que usam os melhores
transportes, que tiveram acesso à cultura (educação é outra coisa), que
se comprazem com outros iguais ao depreciarem com ironias as pessoas
simples, fazendo troça e chacotas daqueles que se expressam atropelando a
“Língua culta”, antes mostrassem essa mesma competência para abraçarem a
responsabilidade social. Entenderiam que seriam mais úteis à sociedade,
à Nação, e consequentemente às “Marias” e aos “Josés”. Quem sabe
oferecer escola para quem fala "droba roupa", "apareio de fone",
"macarrão de pênis", "rezisto em cartera", etc, ainda que o Estado tem
suas obrigações e deveres nesta área.
Rir daquelas pessoas
modestas que muitas vezes lhes “servem”, é desvalorizar a figura humana
antes de tudo. Não compreendem o vazio de alma que se encontram. A
verdadeira e única “Justiça” saberá avaliar a justa dos reais valores.
Depois à cada um conforme sua obra.
...
EM TEMPO:
E
pegando carona no tema “preconceito social”, estamos vendo em nosso
país manifestações de repúdio contra nossos irmãos nortistas e
nordestinos que, grande parcela, votou em favor da candidata oficial, no
primeiro turno, para o cargo de presidente da nação. Os apupos e más
vibrações brotaram em muitos corações de nossos irmãos que sentem-se
filhos de outras regiões, historicamente mais abastadas. Fazemos um
convite para refletirmos juntos, e quem sabe chegaremos à conclusão que
os “vilões”, são “vítimas”...
O povo nortista e nordestino são
os que ajudaram (e ainda ajudam) e muito a construir essa nação. São
trabalhadores por excelência, com alto grau de autoestima, que
sobrevivem em condições e locais sub-humanos, e são fervorosos na fé que
os mantém na última oportunidade de esperança, como quem se agarra há
um fiapo de raiz na beira do precipício...
É muito digno, elevar
as condições de vida de gentes sofridas. Se há distorções, se há algo
errado pelo meio do caminho, busquemos o burilar de melhores ações, o
aperfeiçoamento do sistema, para promover a justiça social, oferecendo,
depois que se “matou” a fome, condições de gerar riquezas, empregos,
educação etc... Ótimo, que maravilha! Mas, repito, NÃO se deve
amaldiçoar e generalizar os “beneficiários” nordestinos, se um ou outro
punhado não soube e não sabe a importância dessa ação governamental e se
encostam na sombra do tirar proveito da situação. Aos políticos que
tiram vantagem eleitoreira, se isso ocorrer de fato, deve-se coloca-los
em seus lugares, justamente ao REFORMARMOS os instrumentos apropriados e
se exercer pressões nas ações governamentais através do voto popular e
outras ações da sociedade organizada. Mas, fomentar o ódio e
desclassificar nossos irmãos, que geograficamente já estão apartados de
tudo e de todos, isso nunca. O povo brasileiro é trabalhador, nota-se
que, na maioria dos lares, todos estão levando a vida da melhor maneira
que podem, se organizando às vezes aos pedaços, mas, estão buscando
novas manhãs...
É como demonizar as “cotas” para as
universidades. Pensemos: os povos trazidos à força do outro lado do
oceano, levados à escravidão, temperados no açoite e no escárnio,
durante dezenas, dezenas e mais dezenas de anos, foram penalizados
simplesmente por existirem nos mesmos dias da cobiça criminosa de seus
algozes, e, com o “fim da escravidão” foram largados à própria sorte (?)
pelas ruas, formando hordas de mendicância. Os filhos dos filhos dessas
gentes, não merecem ser “recompensadas” de alguma forma, por algum
tempo, para equilibrar a balança social? Sim, podemos ser contra as
“cotas”, pois devemos lutar para haver um processo educacional, de
qualidade, dos primeiros passos até às universidades TOTALMENTE LIVRE
PARA TODOS! E aqueles mais abastados, certamente, terão instituições
particulares, competentes no que fazem, que lhes abrirão as portas...
Mas, insistimos, não devemos desclassificar ainda mais àqueles que
sofrem seus “apartheid” particulares, e se dizer que os negros são
privilegiados; ou que os judeus são sanguessugas; ou que os nordestinos
são parasitas sociais; que os jovens não querem saber de nada, muito
menos estudar; ou que o povo brasileiro é atrasado e merece viver na
misérias de seus dias... é uma distorção de realidade, se assim
compactuarmos com essa forma insana de pensamento. Pois, aquele que
possui essa visão de mundo e das pessoas, que desclassifica etnias,
grupos sociais, e outros que tais, precisa rever os seus conceitos e
saber o que há de errado e endurecido no próprio coração e perguntar a
quantas está adoentado e em distúrbio próprio ego. Segmentar, segregar, e
não enxergar o valor das pessoas, que ajudaram ao longo da história
enriquecer a humanidade com o esforço de seus trabalhos, isso é
realmente desumano e sentimento apequenado. Lembrando que os nossos
irmãos negros trouxeram valoroso trabalho nas lavouras, mineração, e, na
educação de suas sinhazinhas (inclusive, os negros nos dias de hoje,
são os melhores atletas não por acaso, pois sofreram no tempo da
escravidão, os cruzamentos genéticos, como se fossem gados, para se
conseguir “braços mais fortes e sadios” para a labuta, além, é claro, em
esforços sobre humano, são cientistas, médicos, advogados, e demais
categorias importantes na sociedade). E nossos irmãos judeus trouxeram
avanços incríveis em todas as áreas do conhecimento humano ao mundo,
além de movimentarem as economias do mundo.
E os irmãos jovens de hoje
não podem ser penalizados nem diminuídos pela má formação escolar que
lhe outorgam, são vítimas da falta de oportunidades como um todo; e
nossos irmãos nordestinos são maravilhosos que sobreviveram e sobrevivem
à custa de muito trabalho em condições precárias na maioria das vezes
(são os melhores pedreiros, os melhores cozinheiros, as melhores mãos de
obra, e muitos intelectuais fantásticos, e por aí vai...), como também
os são importantes nossos irmãos de todas as outras regiões do país,
pois são importantes não por habitarem essa ou aquela região, ou
condição social, mas pelas qualidades do vigor humano que lhe competem à
construção de si próprios.
Quando se olha para um todo, devemos
nos habituar com a visão do estadista e não do reacionário, pois
somente construiremos a nação dos nossos ideais se o convite for para
TODOS os filhos da pátria a participarem e dando-lhes condições para
tanto. Segmentar é enfraquecer-se. Certamente, haverá muitos que não
quererão abraçar as oportunidades, caso existirem, se isolarão por eles
mesmos; mas o processo evolutivo de uma nação, de um povo, mesmo
aparentemente a passos lentos, deve-se saber que o mais importante é o
rumo, é a direção certa!
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