quarta-feira, 19 de outubro de 2011

SEU OLHAR
Autor: Nilton Bustamante

Seu olhar não é apenas a maneira dos olhos observarem o perto e o longe
Seu olhar tem algo que vem, que vem, que vem...
Talvez da força das cachoeiras saltando da coragem dos olhos fechados
Em contínuo mergulho

Tem algo que vem, vem vem vem algo da braçada enfrentando correnteza
Insistindo um destino somente; algo da flecha no peito chorando dor e gozo do amor,
Mel às vezes, às vezes amargo da flor colhida pela manhã

Ah, esse fogo que se espalha, que foge ao controle comendo forte a mata do corpo
Último pelo, último apelo até o grito ancestral...
Explosão numa só voz de todos os desejos soando mil frenéticas idas e vindas

Seu olhar deixa nua qualquer mentira crua, ingênua, infantil, de tal maneira
A vergonha nem adianta trazer o manto e cobrir tudo
Será em vão,
Nem quando o interminável perdão clama a fé e pede mais uma vez por sua vez

Seu olhar me silencia, me desfaz em caídas lágrimas emocionadas
Pelos cantos para não chamarem atenção,
Quero que você saiba que me tornei liberto da prisão do medo,
Eu que tinha o tempo todo a chave em minhas mãos, não sabia


Ah, esse desejo, ah, essa certeza me acompanham desde então, como pode ser
Esse mistério, esse vendaval bem aqui dentro de mim?...
Eu sentado na beira da lua minguante, vendo do alto todas as sombras
Dos nossos corações apaixonados

Eu não consigo mais ficar sem me desmanchar e me largar na força das cachoeiras,
Saltando mais que essa coragem no frio terrível dos abismos
Mas minha vontade é tanta, é tamanha de te abraçar, de te amar, que essa flecha
Atravessada no meu peito é apenas para me lembrar...
Que eu amo tanto, tanto, tanto, que deveria eu todos os dias esperar
No portão a quem amo somente pra dizer que ainda há amor, pra dar boas-vindas,
Pra se abraçar, dizer que a espera foi torturante, e que agora – o encontro – é sol abraçando a noite
Presente pra ser aberto, a tirar os laços, rasgar embrulhos e papéis, desfazer nós,
Jogar longe os sapatos, meias, e viver o instante do para sempre,
Sempre nós dois em contínuo mergulho no amor!




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Vivaldi
http://www.youtube.com/watch?v=WX83BSR0mug
(Philippe Jaroussky - Vedro con mio diletto)

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ABAJURES


ABAJURES
autor: Nilton Bustamante

Ai, os meus olhos...
Ver o mundo pela janela, neblina molhada, úmida névoa

Ai, os meus olhos
Ai, meus olhos...
Filmes antigos guardados, largados num canto qualquer
Começam novamente a me perturbar
Com essa saudade
Que idade não chega, não entrega, nem esquece, aquece
Esse meu coração
Já acostumado a sofrer esse delírio, esse choro de Tango
Dançando no salão vazio, rodopiando
Em suave alucinação
Perfume grudado na pele abraçado ao segredo dos suores gentis

Ai, essa vontade...
De uma vez mais e um pouco mais falar as mesmas falas
Ouvir os mesmos silêncios dos sussurros que me enganam
Que eu não disse mais
Em outros ouvidos, outras orelhas mordidas num descuido
qualquer...

Ai, essa ansiedade...
Pegar suave macias mãos planando no vazio, quem dança
Mais uma dança em noite de luz abajures

Ai, esse desejo insano...
De entrar de vez nessa nave de quem vai e nunca volta igual
Coisa de quem ama e não quer mais esquecer...

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Astor Piazzolla
http://www.youtube.com/watch?v=4wh8398FbKk
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terça-feira, 18 de outubro de 2011

SOB OS CÉUS DE PARIS



SOB OS CÉUS DE PARIS
 Autor: Nilton Bustamante
Hoje andei mais nos céus que meus pés acostumados ao chão,
foi uma tal leveza viver a fantasia
tanto quanto podia,
desfazendo qualquer roteiro, seguindo por onde meu coração
pudesse sentir o beijo dividido em dois,
cantando com os olhos
a alegria de não seguir só.
Ah, hoje estou pelas alamedas
com a certeza que devo ficar pouco mais...
Ai, essa dor gostosa no peito, talvez sinais do amor
mostrando que é preciso ir, seguir
pelos céus, se arriscar nas alturas e descer como um mortal
que se encanta com a possibilidade do voo
e não sabe mais parar, não mais realidade ou sonho,
dançar a imaginária dança,
rir baixinho pra ninguém dizer que não é possível andar a um palmo do chão.

A paixão é coisa estranha, coisa de novela!

Mas, alerto, não quero ser feito aquelas sentinelas, atentas, que se endureceram no frio da solidão
com mais medo de viver que o medo de morrer, sem descobrir, sem saber, se o amor existe, ou não.
Hoje andei com mãos livres
para o abraço apertado,
tudo por um triz...
Hoje andei pelos céus tingidos por sol levemente rosa e azul,
fiquei com meu coração e lábios úmidos
sob os céus de Paris...


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Le Fabuleux Destin d'Amélie Poulain


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Sous Le Ciel De Paris
http://www.youtube.com/watch?v=

domingo, 16 de outubro de 2011

HAMLET


HAMLET
Autor: Nilton Bustamante

Por onde singras tua alma
Será a terra, serão os céus?
Avantajas sobre o intrépido verme que se lança entre montanhas em grãos,
Cai em desventuras ausências de miragens da vida e da morte
Porque o tempo é sutil, a espera é cruel.

Vai-te e não te abandones,
Que longas são as horas,
E eternos os sermões entre mil buzinas, em semáforos vermelhos nos azuis
Dos dias e escuros das noites
Das fantasias que chamam teus pupilos em infames promessas
Das mil bocas sem palavras, sem cantil...

Arde a febre, arde o olhar,
Que se entrega em misteriosos desejos na calada da sorte envelhecida, senil,
Sem juízo, no final sem aplauso algum. Ah, tenra castidade, sem morada alguma,
Que te faça a decência, que possa acreditar no leito das ervas dos campos...
Sê meu espanto nesta hora
Tenhas a glória do descanso
Em prolongada e infinita hora em que a mente faz mais outro arroubo, pueril,
Nas vertigens dos enlouquecidos tormentos que se perdem nas movediças
Certezas que de encanto em encanto a história é apenas mais um outro gole...
Sê meu anjo nesta demora
Tu que bem sabes sou mais um que se vai ao longe do tempo algum
Subindo e descendo entre grãos de areias, grãos de terra feito ondas,
Sendo um verme que se faz navio que singra a terra, singra os céus, singra os mares feito pirata tomando na alma o interminável rum...

Ah, tu que me vês Hamlet sem juízo em fúria e vingança da imagem
Que aprisionei, sê piedoso, contemplas com teu coração a esperança
Para eu acreditar em tuas asas e vencer minhas masmorras que se fazem ondas
E me tiram o sono, a coragem e a paz...

Ah, esta imensa união, que não quer se separar, se dividir,
Faz que tu sejas única frase, único nome, sobrenome,
Minha reza, o meu ave em súplica
Único destino que se come pelo rabo, em ciclo sem fim...

Em todas as instâncias,
Em todas as circunstâncias,
Sou tua insônia, e tu nave errante em mim!

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Hamlet
http://www.youtube.com/watch?v=J2afRrNSgh8


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