segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

ALGO QUE NÃO SEI EXPLICAR

ALGO QUE NÃO SEI EXPLICAR
Autor: Nilton Bustamante

Que as horas não me façam me apressar, pois tanto que preciso agora apenas da paz dos quadros-pensamentos se movimentando em filmes que quero assistir, reprisar, deixar-me seguir por algo que não sei explicar...

Pensar que não sou mais eu aqui, apenas feixe de luz, explosão, sentimentos e vontades que se lançam, se projetam pelas negras noites do olhar, que se vão sem rumo, sem ao menos querer voltar, algo que pulsa e se torna paixão dos loucos que deliram pra deixar o mundo mais sentido, mais bonito.

Não é nada que se vai ao longe, nada que não se possa pegar com as mãos e encostar os lábios, morder com vontade a boca em um quarto que se faça nem grande nem pequeno; um canto, um recanto que não seja dentro nem fora; nem acima nem abaixo, mas que se tenha um tanto dos ares dos dias, das noites e das madrugadas que abrigam os segredos ouvidos em baixo tom, apenas pra ninguém precisar saber...

Sim, um canto, um recanto, um quarto que caiba os olhares e os fechares dos olhos; que se transforme em sonhos curtos ou longos, abraçados, separados, dedos entrelaçados, que se ouça os "ais" e os espasmos dos encontros do tamanho do real e do imaginário, que se chore lágrimas sem precisar dizer o motivo, sem que se precise jurar, nem que se ponha a prova verdades ou mentiras, posto que nessa falta de ar não cabe mais nada do que sorrir canto de lábios, insinuar malícias das mais docemente malditas com cara de santo que engoliu as chaves e não vai deixar o sonho partir...

Um canto, um recanto, talvez um quarto desses de gramas e céus, nada mais que um quarto da casa amarela em que as horas não me façam me apressar...


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Alice Fredenham

https://www.youtube.com/watch?v=4KUpKXUSpfM

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

TIJOLOS À VISTA

TIJOLOS À VISTA
Autor: Nilton Bustamante

Subir a escada do que penso ser sonho
Somente para ver o longe, somente para ver o perto
Até onde os olhos conseguem ir
Sentir essa liberdade vigiada que insiste em ser asa
Tablado, pedaço de palco, ser lágrima, sorrir

Minha lógica
são ondas, são os arcos das canções
Que eu canto sem perceber
Disco antigo, túnel do tempo, quando acreditei
Em tudo, até em mim,
Até subir degraus e ver esse longe perto
Perguntar sobre o que minha carne sangraria
Por quem minhas lágrimas vibrariam
Com o risco da invasão vinda de longe, bárbaro invasor

Minha alma tijolos à vista
Minha muralha alta
Somente a escada para quem minha irracionalidade de mulher
No doce das vertigens desejar

É mesmo assim:
Enquanto fico vou longe

Mas, lamento, somente vão me saber nos vestígios, marcas deixadas pelo incomum
Do mundo, pelos descaminhos passos de dança, passos quentes, tortos e frios,
Pra um dia saberem também desses suspiros que vêm com a noite
E insistem em ficar pra salvar a própria alma
Enquanto os olhos fecham-se, abre-se o coração em mil ouvidos
Sentir o que não diz a canção
Outra questão, outra paz, outra tormenta
A letra é de quem escreve sua própria ilusão
E eu gemo a minha

Minha alma tijolos à vista
Minha muralha alta
Me faço aos pedaços
No doce das vertigens me entrego

Sou mulher
Ele, invasor, homem com lira e poesia às mãos



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Anna Netrebko - Donde lieta uscì (Giacomo Puccini - La bohème)

https://www.youtube.com/watch?v=jTNC_M_PzFY

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(foto by Lê)

sábado, 5 de dezembro de 2015

DOCES TROVOADAS

DOCES TROVOADAS
Autor: Nilton Bustamante

Quero escrever, mas a tinta da imaginação não vem, não chega
Estou como quem correu tudo que precisava correr
Tudo que precisou respirar
Tudo de tudo
E se cansou, esgotou-se, sem força pra reagir resolveu olhar o infinito

Hoje aquela volúpia, aquela vontade de luta, cede lugar
Pro simples
Do pensamento medido a palmo, hoje o voo está baixo
Esmoreço vendo homens formigas batendo cabeças
Querendo vencer a qualquer preço, a qualquer custo,
Ganhar o brilho do brilho,
Outros olhares,
Mas de nada valem, nada servem
Se o coração pesar as pedras jogadas
E o beijo não saborear o hálito que a vida traz do amor

Quero escrever, mas a tinta da imaginação não vem, não chega
Antes qualquer opinião, não mais precisa ser aquela de sempre
Não mais precisa estampar o carimbo do tudo aprovado
Hoje é um dia daqueles que a trégua trouxe bandeira branca
Feita de pedaços dos lençóis, fronha e cobertor
Hoje é para se ficar sentado e rir do tempo
Rir da pressa
Rir das brigas, das intrigas, das cronometradas corridas,
Hoje é dia de rir de mim

Sou lixa grossa, nem sei se o que faço consegue deixar recado
Dentro do meu sapato
Pra não esquecer
Que não é pra calçar, não hoje, hoje é dia de andar descalços

Os brindes por aí,
As mesas de bar equilibrando o peso de tanta conversa, tanto papo,
Tapas, beijos, abraços,
Não me são suficientes pra me embriagar,
Não me são, hoje não o riso fácil pra nada, quero respeitar o riso alheio
O sorriso nos lábios que não são os meus
Merece meu minuto de silêncio,
Meu respeito,
Não por pena, não por querer ter igual, nem mesmo estou triste,
Apenas por escolher, por agora, luz
Que chamei por companhia,
Veio porvir nos cantos dos olhos meus
Pra, quem sabe, encontrar universo espaço, pedaço de sonho a mais
Ficar espaçonave dentro de mim

Quero escrever, mas a tinta da imaginação não vem, não chega
Eu me deito e espero que a noite seja, hoje sim, semente que voa
Seguida por meus olhos, seguindo o voo, desviando do sono,
Que a noite seja dia, seja toda doces trovoadas por mim

Valentina Lisitsa - Moonlight Sonata Op.27 No.2 Mov.1,2,3 (Beethoven)




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sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

ALMA DELICADA


ALMA DELICADA
Autor: Nilton Bustamante
Hèlade!
Hélas!
Sou helênico, ou melhor, tornei-me helênico. Pertenço a Hèlade, Grécia antiga.
Exclamo minha saudade, minha dor, exclamo hélas!, dos franceses poetas.
Quem sou eu agora?
Qual partido toma minha maior porção?
Helênica! Helênica!
O diamante é  o  metal invencível usado pelos deuses ao fabricar suas armas.
Perguntei a mim mesmo por algum tempo: 
Qual é arma? 
Para conquistar o quê?
A resposta veio quando você surgiu, 
porta adentro, em minha vida.
Seus traços, seus contornos, são o que há de melhor das origens helênicas.
Do Olimpo, veio a arma feita mulher para conquistar os homens poetas.
Ser diamante na construção, nos objetivos, 
na pureza helênica, eu até posso entender. Mas, como consegue alma tão delicada?
Como condenar os troianos pelo rapto, abismados  pela  rara joia helênica? 
Terei coragem de fazer  o mesmo?
No cavalo moderno puxado pelos cabos de aço, 
no sobe e desce do arranha-céu, nos beijamos mais uma vez. E, não mais que de repente, foi-se.
Onde fica esse tal de Olimpo?
Quando nos amarmos, como será?
Tornar-me-ei um deus mitológico?

Tornar-se-á minha deusa helênica uma mulher de carne e osso repleta de desejos para serem saciados? 
Simplesmente humana?
Qual é o medo?
A metamorfose terá dor? Terá gozo? Toda dor tem um pouco de gozo. Todo gozo tem um pouco de dor. Nada que os moinhos de ventos não possam sanar  
- transe de ilusão e desejos.
Se disserem que seus traços são romanos, não estarão errados... As romanas também usam túnicas. Suas gentes andaram pela Grécia antiga.
Eu avanço meu olhar sobre o poço de desejos. Tento alcançar o melhor ângulo das brancas e delicadas porcelanas; rara beleza.
Beijo sua boca com volúpia merecida, na verdade quero alcançar todos os lábios.
Desça do Olimpo, venha me visitar em sonho. Acorda-me. 
Vamos nos amar.
Seja minha aos poucos, quando puder, 
joia helênica.
Seja minha, alma de deusa.
Seja minha, alma delicada. 

Seja minha, mulher! 


quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

YAACOV PETICOV


YAACOV PETICOV
(Autor: Nilton Bustamante, por desdobramento de alma)
Estava eu, em desdobramento de alma, em um auditório. Havia muita gente. Quem, de certa maneira, comandava por um momento o evento parecia ser o Silvio Santos (Senor Abravanel). Enquanto alguém falava à plateia, fiquei em um canto, próximo, desenhava ilustrações, algo sobre o sentido do que era dito naquele lugar.
Houve um hiato, senti que deveria subir ao palco. Comecei a falar. Senti que precisava dar algum alento para aquelas pessoas. Do pouco que me lembro, meu tema foi para levantar o ânimo de todos ali, percebi que eram de origem semita, falei-lhes, então, sobre a importância do povo judeu para a cultura da humanidade. Discorri sobre a grandeza do violino na cultura judaica e de que sempre houvera pessoas, judias, por detrás de grandes homens da música clássica, tais como Beethoven, Bach, Mozart, Chopin...
Nisso, passou por mim um jovem, sorriso nos lábios, mentalizou-me que havia gostado do que eu havia “falado”. Não sei dizer o porquê, mas alguém soprou-me que o nome dele era Yaacov Peticov (imagino que é assim a grafia do nome).
De repente, estava eu em outro lugar. Andava ao lado de um homem. Falei-lhe, mentalmente, sobre a passagem dessa vida para a Pátria Celestial. Confortava-lhe sobre seu filho que havia partido. Nisso a sua mulher chegou-nos, e ele a informou que era para me ouvir. Ela ironizou de maneira leve, perguntando se ele estava fazendo análise. Sentamo-nos, o homem e eu em um banco. A mulher, em seguida, sentou-se sem cerimônia no colo dele, deitou-se com a sua cabeça em meu colo e, ficou olhando o céu − intimamente, pensei, é ela que fará análise, agora. Fiquei muito surpreendido, pois aquela “mulher”, era na verdade um homem, inclusive com bigode. Tratava-se de um casal de mesmo sexo, mas, nitidamente, dava-se para perceber que, apesar do corpo masculino, a alma era totalmente feminina.
A mulher assustou-se, quando, comecei a falar sobre o filho deles. Resumidamente, do pouco que ainda permanece na tona do meu consciente, falei-lhe que aquilo que Deus cria não se desfaz, não se acaba, não se extingue. Pode-se tomar outra forma, outro lugar, e falando, mental e calmamente, afirmei que a alma do filho querido era parte da essência do divino, e isso já o qualificava para um lugar na criação divina.
Finalizei, que as estrelas foram feitas para brilhar nos céus, e o filho querido que havia partido, da mesma forma, está em um lugar nas alturas. E quanto mais alto, melhor, o brilho alcançará maior número de pessoas.

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Fiddler on the Roof - performed by 14 year-old violinist Solene Le Van
https://www.youtube.com/watch?v=Db1fogJXDIY
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