segunda-feira, 5 de abril de 2010

ACONTECEU ONTEM À NOITE


ACONTECEU ONTEM À NOITE
Nilton Bustamante

Andando em espírito pelos interiores dos campos outros, seguia por caminhos diferentes desses que estou mortalmente acostumado, transitório, passageiro.

Eram paisagens surreais, filme tridimensional, onde se via o horizonte de um jeito incomum, algo próximo daquilo que conhecemos como marca d’água . E o caminho era em frente, sempre em frente. Não havia contornos, retornos, a força gravitacional dentro de mim, era minha bússola.

Do nada, a rotina é quebrada, o bizarro manifesta-se na forma de um ser sangrento, feroz, grande, encorpado, parecendo um galo de uma massa de 3 metros, disforme, contornando uma presa, uma mulher, nua. E as bicadas eram tantas, que o sangue era acompanhado por pedaços de carne do corpo da jovem, pobre jovem. Mas, para minha surpresa, ela se contorcia de prazer, com aquele sorriso Monalisa, hipnotizada, contudo era nítido que ela estava em transe, psiquicamente tomada. Bateu-me o desespero para acordá-la daquele desastre, tirá-la daquela armadilha amaldiçoada. E os meus pedidos foram todos em vãos.

Quando me aproximo com a fé que eu nem sabia dentro de mim, parto pra cima da besta sanguinária. Ela, em piscar de olhos, vai pras alturas com sua presa, fora do meu alcance. Sinto que ‘a coisa’ emana um “que” de desdenho, a mesma sensação que passam os obreiros das trevas para seus oponentes. E, não sei dizer como, mas providencialmente algo se materializa: uma arma acoplada à uma corrente, elástica e forte, muito forte. Algo parecido com um ‘maço’ da Idade Média. E faço o rodopio da nova arma, nova aliada, e a lanço às alturas em direção do contraditório. A jogada é certeira. A peça enlaça-o e o torna ao solo, diante de mim. Sem pestanejar solto a moça, que acorda do transe e não sei mais dizer pra onde ela se foi, para quais mãos em novo abrigo. Diante do instante atordoante do monstrengo, quando, bem perto, ao ponto de tocá-lo, percebo em meu íntimo que aquela coisa medonha é um irmão desencarnado lançando-se à mercê de sua loucura obsessiva. Sem tempo a perder, enfio minha mão sobre o peito dele, observo cores disformes, inconstantes se movimentando, trocando de lugar, trocando de tons, e minha mão vai se aprofundando cada vez mais, sem dimensão, e vou mentalmente exclamando, convicto, o nome de Jesus, enquanto vai se emoldurando, agora, a forma de um coração, um coração humano. E a palavra mental, Jesus! vibrando em minha mão, vai marcando em brasa aquele coração.

Não mais havia fera, somente um homem, acanhado, diante de mim. E a nova forma, agora totalmente humana, desmaterializada de toda a insana fantasia, acordou para sua nova realidade e seguiu um caminho que não mais me pertencia saber. E a mão que me guiava era invisível, discreta, e presente como a voz do vento em seu cântico celestial.

E despertei com os pássaros me chamando para minha outra realidade, uma nova manhã, uma outra página da vida a escrever.
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Dante’s prayer:http://www.youtube.com/watch?v=dge_MOBGxjo

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